Meu corpo agora passa a compor o espaço de uma xícara de leite e algumas rosquinhas de coco esfarelando-se ao tocar aquele lindo e hostil leite quente. O cenário da imersão torna-se belo, aparentemente belo. A rosca infla e desmancha-se sobre o saboroso e ofuscante leite, que quente fervilha suas emoções, ao tocar aquela rosca.
E o que sentia a rosca? E o leite? Naquela trama eles pareciam felizes, ou precisavam ser felizes, ao tornarem-se um hibrido de emoções. Pois, dali em diante eles seriam um corpo só (até segunda instancia).
Diante da aparente felicidade de ambos,sabia eu, da história de antes deles se fundirem, e fluírem a ponto de afirmar tanta felicidade? Como se sentia a rosca em meio a tantas roscas que iguais a elas se viam solitárias? E o leite que retirado do seu campo homogêneo passou a compor um campo estranho, a tornar-se e entrelaçar-se em um corpo estranho?
Eu como corpo participante desta história, compositor e responsável pelo hibrido que se formou, digo: que as emoções não existiam antes, elas eram homogêneas. Por mais que o leite e a rosca surgissem de misturas que o tornaram leites e roscas hibridas elas acabavam tornando-se homogêneas. E não existem emoções dentro de uma mesmice, dentro da homogeneidade. Como o leite poderia ser feliz ao ver na sua frente o mesmo leite de sempre, a mesma partícula que se misturava com a mesma partícula e dava origem a um mesmo ser. E a rosca que em meio a tantas roscas não se sentia potente porque não podia inflar, e misturar-se a outro ser a fim de tornar-se algo corporificado, se desmanchando, se dividindo e se multiplicando em tantos sentimentos que em si poderiam se inscrever.
E digo mais a rosca e o leite a partir dali tornaram – se corpos e tornaram-se fulgazes, triste, alegres, dançantes, fúnebres e donos das mais variadas , mais caóticas e mais paradoxais.formas de sentimentos que seus corpos pudessem multiplicar .
E agora vendo aquele instante , aquela coisa que passava despercebida por mim durante todas as noites que passei a preparar essa imanência de corpos para me aconchegar das coisas duras de minhas rotinas. Vendo este espaço que antes por mim era inabitável, pois tamanha sensibilidade não me acometia antes, percebi que uma coisa dali fluía, e não era o doce sabor daquela rosca ao ser incorporada no leite. O que me acometia era o fato de sentir nas vísceras, a vontade de vomitar e rasgar as palavras ao imergir-me naquele hibrido que se formava, ao compor aquela transa dionisíaca, tornando-me hibrido de minha criação, e do amor que por um momento fui capaz de criar, ali, aqui e agora.
PS: Dedico este texto aos meus sentimentos por uma pessoa muito amada. Por saber que mesmo, diante das dos contratempos que nos tornam o que chegamos a ser, que nos tornam devir saudade, devir tristeza, devir amor etc., sei que um sentimento bom dentro de tudo isso nos tornam similares à rosca e o leite .